Xicuembo (versão 3.0)

memórias & resmungos do Carlos Gil

A minha foto
Nome:

carlosgil2006@gmail.com

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Excelentíssimo Senhor:

Na sexta-feira Vossa Excelência vai ter muito quem o bajule e de si faça seu deus, cumulando-o de promessas para que realize o desejo que é unânime a uma centena e tal de milhões de apostadores: que Vossa Excelência em golpe de mágica transforme a rarefeita sorte em abastada realidade, e faça de remediados milionários e de sonhadores militantes felizardos que passam a podê-los realizar.

Sabendo que já não sou dos primeiros, mas também não desejando cair na multidão de última hora que nessa sexta lhe cantará loas e endereçará preces, junto atempadamente o meu papelinho rogatório convicto que Vossa Excelência cuidará dele e de meu pedido com a clarividência, justiça e bondade que são seu privilégio.

Está na hora Excelência, está nas suas mãos. Da minha parte já eu tratei, aliás, há dezenas de anos que não faço outra coisa: semanalmente registo os meus boletins para seu superior despacho, envelheço olhando a esperança que não se cumpre mas se renova maugrado as sucessivas negas que Vossa Excelência, empenhadamente, me concedeu. Aproveito a deixa e confesso-lhe que já estou cansado. Até porque acredito não ter muito mais tempo para sonhar: as aflições são muitas e rara será aquela que o dinheiro não resolva.

Sim, sempre fui um teso – desculpe-me esta liberdade coloquial – e a coisa tem ido, ido, tanto que até aqui cheguei. Se calhar sou um fura-vidas e poderei aguentar-me assim as centenas de semanas que ainda me calhem de vida, saboreando a esperança que se renova após as desilusões das sextas-feiras. Mas, se calhar e desta vez, com passo maior que a perna e grande risco de escorregar. Estou tesíssimo, Excelência. Não tenho credores à porta mas, se não acontecer o milagre que muito respeitosamente lhe peço, não tardará que divida as esperanças em Vossa Excelência olhar para mim com a de eles não o fazerem. A vida é difícil, Excelência, mesmo para quem joga porque sonha.

Daí este requerimento que apresento a seu atento despacho, onde verto que lhe rogo e suplico que tome em consideração o meu muito pessoal caso. A bolada por inteiro também me parece areia a mais para qualquer camionete, rodoviária maneira que alinhavo para concretizar o pedido e dizer-lhe que tantos milhões só a um são muitos a mais que os necessários, a qualquer um. Mesmo que esse ele fosse eu.

Formalmente requeiro-lhe que considere uma versão moderna do milagre dos pães, com a entusiasmante variante de servir mesa farta a muitos mais que só a um, glutão, e que se poderá enfartar: tome Vossa Excelência as providências necessárias para que, mais uma vez, não haja inspirado ou inspirada que dê tiro em pleno na mouche, e assim os muitos milhões do “Prémio entre os prémios” serão repartidos pelos segundos classificados – que os há sempre..., confraria a que já habilitei o meu desejo de ombrear.

E, quer seja pela fé inabalável e constante fidelidade às suas providências, que remontam a tempos que de tão antigos chamarei de avoengos, seja pela necessidade pessoal que aqui deixei a nu, ou simplesmente pela razão que Vossa Excelência entender como mais apropriada, que esta sexta-feira me inclua nos quase-quase, as quatro cruzes e as duas estrelas*. Seria justíssimo, Excelência.

Termino desculpando-me pelo arrojo em me dirigir directa e tão abertamente a si, Excelência. É que – repare... este requerimento que lhe submeto tem local e data legíveis e entendíveis e assina um seu cidadão – um qualquer!, vossos mais fiéis súbditos e adoradores pelas razões que conhece de ouvir falar e, acredite-me, são tão penosas que até o sonhar precisa da consistência do milagre que Vossa Excelência, requer-se, deferirá e providenciará.

Pede mui respeitosamente deferimento,

Portugal, 2006
Correcção: sou parvo mas não tanto; o segundo prémio é para quem acerta em cinco cruzes e uma estrela, a que obviamente me candidato se não houver nenhum totalista. Mais: segundo li num jornal de hoje, afinal ainda não é esta semana que a bolada é dividida pelos 'segundos' - a haver novamente jackpot. É só ao 13º, e este é o anterior... Assim, decida V.Exª: se insiste em que saia já a taluda não se esqueça de mim; se decidir aumentar a parada e acabar de nos enlouquecer de tanto pensar nisso, recorde-se do meu pedido, supra...

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Este web, não deixa de me fazer alguma impressão...

é que em dois dos dias que considero superlativos na minha vida, não tinha um chavo no bolso (no último até tinha um saldo de - 2 contos na conta, devo acrescentar...

e se escrevesses para ganhar prémios literários, em vez de andares a gatafunhar o sonho dos vulgares, oh meu? - muf'.

quinta-feira, fevereiro 02, 2006 8:47:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

2. vai à 'corrente' do chuinga. beijo - muf'.

quinta-feira, fevereiro 02, 2006 10:27:00 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home

Fight Spam! Click Here!